
DOS IMPASSES DA TRAGÉDIA, O DESAFIO: A EMERGÊNCIA DO FUTURO
Publicado em 22/04/2021 às 12:14
Por André Ricardo Dias
Toda comemoração tem por objeto um modo de rememorar um feito, seja ele um fato ou uma existência com duração no tempo. Essa comemoração pode ou não ser festiva. Hoje, temos motivos para comemorar a existência da nossa entidade sindical e a história das lutas que decorreram dos enfrentamentos e feitos ocorridos na sua trajetória. Entretanto, talvez não tenhamos motivos para festejar, seja pela conjuntura política e econômica que assola os direitos e conquistas da classe trabalhadora, seja por vivermos e sucumbirmos no dia a dia da pior pandemia dos últimos séculos. E podemos conviver com isso de acordo com algumas alternativas frente a esse cenário que se apresenta como (1) difuso – pois somos atacados a partir de várias frentes e nas dimensões de nossa vida privada e enquanto membros de uma coletividade, relações que não se excluem mutuamente – e (2) complexo – às voltas com esses ataques, de repente, estamos juntando numa mesma frase vacinas, ciência médica de ponta, política e direitos trabalhistas num léxico improvável até pouco tempo. Duas alternativas não excludentes podem ser lançadas de pronto: encarar o destino como trágico ou olhá-lo de frente como desafio, mesmo que tantas vezes enigmático. A tragédia, sabemos, diz respeito a um desenlace evitável. O acontecimento trágico na cultura ocidental assim é chamado porque não é uma fatalidade. Na história da nossa cultura, o trágico é o desenlace de um acontecimento que, pelas mãos de seus agentes, encontrou termo exatamente em decorrência das ações e deliberações dos personagens envolvidos. Há tantas opções para esse desenlace quanto às possibilidades de escolha que temos perante um fato. Por isso mesmo a escolha que atinge o herói trágico é carregada de responsabilidade na mesma medida.
O desafio é uma provocação frente ao real. Um acontecimento ou impasse criado que encontra forma nos fatos e seus significados para o mundo, esperando por uma resolução do sujeito que com ele se depara.
Vivemos uma tragédia desde muito anunciada. Longe de ser um acaso, as mediações necessárias para aplacar os efeitos da pandemia foram ou não executadas com as medidas concretas exigidas pelo momento. Temos aí um agente muito claro e as formas que encontrou – ou evitou – para enfrentar o seu objeto desafiador.
Podemos unir a tragédia ao desafio na busca de uma conduta ativa e, portanto, de enfrentamento perante a realidade. A primeira expressa nosso reconhecimento dos acontecimentos e de seus culpados, aqueles que carregam o poder efetivo de decisão e a possibilidade de alterar o curso funesto dos fatos. Esse reconhecimento é a porta da justiça, da responsabilização. Do vírus aos ataques aos direitos trabalhistas, nos deparamos com dois destinos evitáveis: a morte imediata e a dupla pauperização/precarização progressiva do mundo do trabalho.
Responsáveis e escolhas reconhecidas, abre-se o espaço do desafio: o que faremos com a memória do que foi perdido e o que faremos para evitar a repetição trágica?
O desafio nos exige ação. O reconhecimento da tragédia pode ser um caminho seguro para pensar em alternativas de futuro tendo o passado como referencial. Não repetir os erros do passado é a divisa que expressa a emergência do futuro. Pois, apesar dos niilismos do nosso tempo, o futuro resta como inevitável.
Temos à frente nosso histórico exitoso na organização política, no estudo para a compreensão da realidade junto à defesa intransigente da educação pública, gratuita e de qualidade, sem concessões para a especulação financista dos grupos educacionais que vem sufocando a escola pública e educação básica através de seus lobbys e do aparelhamento do MEC e das secretarias de educação nos Estados e municípios. Na busca por ampliação de mercado o controle didático e pedagógico expresso pelos seus sistemas de ensino precarizam o trabalho do educador e rebaixam a qualidade do ensino em função das simplificações e reducionismos exigidos pela lógica concentradora do capital.
Enfim, com os desafios à vista e a consciência histórica no horizonte, comemoremos nossa existência na forma exigida pela realidade: atentos e prontos para o enfrentamento das emergências de nosso tempo.
___
Por André Ricardo Dias
IF Sertão PE – Campus Petrolina